Os médicos concordam há um bom tempo que beber moderadamente pode ajudar pessoas sadias a manter a saúde do coração. Em 1999, um estudo da Universidade Harvard que acompanhou 21.000 homens saudáveis mostrou que o efeito protetor do sistema cardiovascular é obtido ingerindo-se 30 gramas de álcool – o equivalente a duas taças de vinho ou duas doses de uísque. Surgiu agora um estudo que mediu os efeitos benéficos sobre pessoas já doentes de uma bebida adorada pelos brasileiros, a cerveja.
O estudo, conduzido por pesquisadores israelenses da Universidade Hebraica, foi feito com 48 homens que sofrem de doenças coronárias, com idades entre 46 e 72 anos. Metade deles só tomou água mineral. A outra metade foi contemplada com uma dose diária de cerveja. Os pesquisadores notaram que os homens do segundo grupo, no fim de um mês, já apresentavam significativa queda da taxa do mau colesterol e aumento do índice do bom colesterol.
Outro estudo publicado na semana passada pela revista The New England Journal of Medicine centrou a atenção não na dosagem ou no tipo da bebida, mas na freqüência com que se bebe.
A pesquisa feita pelo equivalente do Ministério da Saúde dos Estados, o NIH, com 38.000 voluntários sadios com idades entre 40 e 75 anos, acompanhados durante doze anos, chegou à conclusão de que beber moderadamente em três a quatro dias da semana traz mais benefícios para o coração do que beber em apenas um dia da semana. Aqueles que ingeriram até duas doses de bebida alcoólica em cinco a sete dias da semana tiveram o risco de doença cardíaca diminuído numa proporção apenas ligeiramente maior. O aumento das doses não trouxe benefícios adicionais.
A idéia de aconselhar um gole diário de bebida como terapia é discutida pela comunidade científica desde que pesquisas passaram a associar a ingestão de pequenas doses de álcool à prevenção de doenças do coração, derrames, trombose e até demência. Mesmo diante da evidência científica, muitos médicos acham que ainda faltam elementos para propor uma alcoolterapia. Para o cardiologista Jayme Diament, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), a afirmação de que a ingestão de pequenas doses de bebida alcoólica traz benefícios à saúde deve ser vista com reserva. "Se uma pessoa não tem o costume de beber, é muito temeroso aconselhá-la a começar, dizendo que isso ajudará a evitar problemas no coração. Seria introduzir um hábito que pode eventualmente se transformar em vício", diz Diament. Os médicos advertem que quem tem gastrite, úlcera, diabetes, nível de triglicérides alto, antecedentes de alcoolismo na família ou é obeso não deve beber, nem mesmo moderadamente. Para pessoas nessas condições, os efeitos adversos sobre outros órgãos superam os benefícios para o coração que uma bebidinha pode trazer.
Umas das primeiras luzes a respeito dos efeitos terapêuticos do álcool surgiram no fim da década de 70. Elas vieram por uma comparação estatística quando cientistas descobriram que os franceses, apesar de uma dieta rica em manteiga, queijo e outros tipos de gordura, tinham índices de doenças do coração bem menores que os de outros povos, como os escoceses, finlandeses e americanos.
O segredo do chamado "paradoxo francês", segundo os especialistas, está no consumo freqüente de vinho tinto. Além do álcool, o vinho contém outras substâncias protetoras das artérias, como os flavonóides. Para um país como o Brasil, onde se bebe mais cerveja do que vinho, é uma boa notícia saber que a "loira gelada" também ajuda a prevenir doenças do coração. Não tão boa assim é a constatação de que, de acordo com a pesquisa israelense, a dose protetora – para quem é cardíaco – é de uma mísera latinha.
Fonte: Revista Veja