Brena Bäumle, sócia diretora da Bäumle Organização de Feiras, especializada na organização e administração da participação de empresas exportadoras brasileiras em feiras internacionais de negócios, adianta que o guia de protocolos para definir como o setor irá trabalhar no mundo pós-Covid19 já foi divulgado na Alemanha. Confira a entrevista exclusiva ao portal Newtrade.
1) Como o setor de feiras de negócios está se organizando mundialmente para se adequar e poder voltar a operar?
O setor de feiras e eventos é muito amplo e complexo, que contempla diferentes disciplinas e provedores de serviços, tais como pavilhões e centros de exposição, agências e organizadores, transportadores, montadores de estandes, o setor de catering, empresas de limpeza e segurança, tradutores, locadores de equipamentos e muitos outros.
A maioria são empresas de pequeno e médio porte, que trabalham com subcontratados. E o público também é amplo e complexo. A indústria de exposições européia é a líder global em termos de capacidade, qualidade e rotatividade dos locais de exposições. Representa quase 50% do mercado global de feiras, segundo dados da European Exhibition Industry Alliance – EEIA e abriga as principais feiras internacionais de B2B e B2C, que são referência e palco dos principais lançamentos mundiais.
Então é natural que a gente espere uma maior movimentação para a retomada, vinda de lá. Muitas das exposições canceladas são as feiras líderes mundiais o que tem um impacto gigante nas empresas e nos setores relacionados.
Vários organizadores, centros de feiras e associações ligadas ao setor publicaram diretrizes e iniciativas para promover a reabertura das feiras de negócios nos últimos dias em seus respectivos países. A UFI – A global Association of the Exhibition Industry analisou todos os documentos e com a ajuda de uma força-tarefa de membros do mundo todo, reuniu e um texto único as recomendações necessárias para o cumprimento das diretrizes da OMS e das autoridades nacionais de saúde. Esse documento, divulgado na última terça-feira, dia 5 de maio, é hoje o guia que irá, no momento adequado, orientar a retomada das feiras de negócios em mais de 100 grandes centros no mundo.
Outro avanço concreto é o acordo assinado na última quarta-feira, dia 6 de maio, entre o governo da Alemanha e os estados federais (que são, no final das contas, os donos dos centros de feiras e das promotoras alemãs – empresas de capital misto – como a Deutsche Messe AG de Hannover, a Koelnmesse de Colonia, a Berlim Messe, Frankfurtmesse, etc.) que primeiramente separa as feiras de negócios de outros eventos de massa, como eventos esportivos e shows, e dá autonomia para cada estado decidir quando será seguro retomar o calendário e a realização das feiras comerciais. Em suma, as feiras não serão mais consideradas parte da categoria de grandes eventos e atendendo aos altos requisitos de regras de higiene e distanciamento, poderão ser realizadas em muito breve.
Talvez até bem antes de setembro de 2020, como era o planejamento anterior. Estes são passos importantes no sentido de reiniciar a indústria de feiras, como plataformas de inovação e cooperação para a recuperação da economia na EU.
2) A indústria de eventos mudará?
Novos comportamentos e hábitos estão sendo formados, que serão uma característica permanente de nossa vida. Haverá um “novo normal”, mas o presencial continuará sendo uma parte vital de como socializamos e fazemos negócios. Muitos eventos adiados, e que ainda não tem data para acontecer no segundo semestre, provavelmente nem acontecerão mais esse ano.
O que talvez seja melhor, porque os expositores não conseguirão aprovar verba e organizar uma participação efetiva em muitas feiras em tão pouco tempo.
Será vital dar aos visitantes a confiança de viajar e de se misturar com centenas ou milhares após um longo período isolado. Aqui haverá um impacto no número de participantes nas feiras. O que poderá ser excelente para os negócios, pois o ambiente ficará mais focado. O que estamos enfrentando é a criação de uma mudança de longo prazo no comportamento dos negócios e na maneira como interagimos e fazemos negócios. Todos nós precisaremos ter uma forte presença on-line e presencial.
Precisamos estar mais próximos dos clientes com ofertas on-line para complementar os eventos presenciais. Muito já foi discutido nas últimas semanas sobre eventos virtuais, mas eles serão o apoio e o complemento dos eventos presenciais em 2020 e 2021 com toda a certeza.
3) As novas normas irão possibilitar que os eventos mantenham a sua eficiência? As feiras continuarão sendo a principal ferramenta de marketing para os expositores europeus?
Sim, estamos falando de um mercado consolidado e financeiramente forte, que é extremamente resiliente e já se adaptou a inúmeras situações de crise, como ameaças de terrorismo, o Ebola ou a gripe H1N1, só para mencionar algumas. Adaptações vão sendo feitas, mas a plataforma segue sendo muito útil e eficiente. Para se ter uma ideia, o investimento médio anual em feiras na Alemanha é de 9,6 bilhões de euros segundo a AUMA – Association of the German Trade Fair Industry. 17.000 empresas expositores chineses participam como expositores em feiras na Alemanha por ano e 230.000 pessoas trabalham diretamente com feiras de negócios só no país.
Os promotores alemães já afirmaram que as grandes feiras alemãs podem atender aos requisitos de saúde, devido à sua forma organizacional e aos modernos centros de feiras que utilizam. Hoje já dá para se dizer que os promotores têm as ferramentas, o dinheiro e estão em condições de cumprir as diretrizes oficiais do Instituto Robert-Koch (agência de saúde pública da Alemanha) sobre higiene e distância física. Então, tão logo os governos possam definir que o risco passou, as feiras voltarão a ocupar um
lugar de destaque nos planejamentos de marketing das empresas.
4) Existem setores muito atingidos? Pode dar algum exemplo?
Acredito que as montadoras de estandes estão sendo as mais afetadas. O COVID-19 coloca em risco quase 250.000 empregos na construção de estandes em toda a Europa, segundo uma pesquisa recente da Federação Internacional de Serviços de Eventos e Exposições (IFES). Estima-se que essas empresas percam pelo menos 50% de seu faturamento anual.
São cerca de 1.750 empresas montadoras de estandes na Europa, se contarmos as mais importantes. A maioria das feiras ocorre no início do ano e, depois, ocorre uma pausa no verão entre o final de junho e o início de setembro. Os 40% restantes dos eventos ocorrem no outono entre setembro e dezembro. O desafio é como essas empresas irão sobreviver até setembro, se estão tendo que lidar com uma montanha de dívidas e taxas que devoram qualquer chance de estabilidade financeira.
Fonte: New Trade – 11/05/2020