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As famílias são o berço de um sem número de empresas em todo o mundo. No Brasil, grandes companhias que hoje são totalmente profissionalizadas, como Grupo Pão de Açúcar, Itaú e Magazine Luiza, nasceram como negócios familiares que, em determinado ponto do crescimento, souberam trazer outras mentes e vozes aos processos decisórios.

Mas essa não é a regra: segundo um estudo global da PwC de 2016, 43% das empresas familiares brasileiras não têm um plano de sucessão, e apenas 12% do total chegam à terceira geração de administradores. Em muitos casos, criar um conselho consultivo evitaria problemas que acabam decretando o fim de uma companhia ou, no mínimo, prejudicam seriamente sua gestão, segundo especialistas convidados pela Women Corporate Directors para um debate sobre a gestão de empresas familiares. “As empresas familiares geralmente começam dentro de casa, vão da mesa da cozinha para a mesa da sala de reunião. Conforme dá certo, chega um momento em que a criatura fica maior que o criador, e dificilmente os donos têm expertise para suportar esse crescimento”, diz Richard Doern, especialista em GRC (Governança, Riscos e Compliance) e no processo de recuperação de empresas. “Eles precisam de ajuda externa para auxiliar nesse processo, e é importante que saibam olhar para fora e buscar profissionais competentes para esse conselho”.

Isso não vale apenas para pequenas empresas. Segundo ele, há no Brasil pelo menos 15 mil companhias de capital fechado, muitas de origem familiar, que faturam mais de R$ 100 milhões por ano e, apesar desse porte, não contam com um colegiado do tipo para ajudar na tomada de decisões. “Conheço uma rede de supermercados que fatura R$ 2 bilhões e não sabe o que é planejamento estratégico. Isso não tem a ver só com o tamanho, mas também com a situação da empresa e sua necessidade”, afirma.

O que faz, e quem faz

Para empresas que surgem dentro de famílias, nem sempre está claro quando é necessário contar com uma ajuda externa, ou, nem mesmo, como se organizam esses conselhos. Especialista em coaching e sócia da Moura Sales Consultoria, Mariana Moura lembra que conselhos consultivos são diferentes não só dos conselhos familiares, como também dos conselhos de administração presentes em muitas companhias.

“O conselho familiar cuida mais do engajamento da família proprietária com o negócio e busca preservar os valores da família no dia a dia da companhia. Já o conselho consultivo tem o foco na condução do negócio em si, geralmente com um caráter de mentoria, auxiliando os sócios na tomada de decisões”, afirmou, durante o debate que contou com uma plateia de mulheres executivas, conselheiras de empresas ou interessadas em entrar no ramo. “É diferente também do conselho administrativo, que costuma ter uma função estatutária de tomar a decisão nas empresas”.

Estabelecer esse órgão, diz Mariana, não pode acontecer sem uma reflexão anterior sobre quais são as necessidades da empresa e do que se pretende alcançar com esse novo passo. “Antes de criar qualquer órgão de governança, é importantíssimo se perguntar ‘para quê’ e ‘por quê’ se está fazendo aquilo. Com isso, será mais fácil identificar qual tipo de conselho é o mais adequado e que tipo de conselheiro deve ser buscado”.

Normalmente, diz Richard Doern, é a área financeira que gera a necessidade de buscar uma ajuda externa nas empresas. “Cerca de 80% dos conselheiros do Brasil têm perfil financeiro, a área em que as famílias têm menor conhecimento. E é ótimo que se tenha alguém que saiba lidar com instituições financeiras, trazer dinheiro barato para dentro da empresa e contratar uma auditoria”, afirma. “Em algum momento, será criada a demanda por um segundo conselheiro, geralmente para ampliar a visão comercial e de mercado. Isso geralmente quer dizer que a empresa está dando certo”.

Dificuldades

O que muitas vezes torna difícil implantar uma gestão profissional nas empresas, mesmo com o auxílio de conselhos consultivos, são fatores como a gestão personalista e os conflitos familiares, segundo Letícia Costa, que, além de sócia da Prada Assessoria Comercial, é conselheira de empresas como Localiza, Mapfre e Totvs.

“Quando há conflito familiar, eles têm mais receio de trazer membros externos, e, quando trazem, é alguém muito próximo da família, porque não querem expor toda a situação. Aí, quando fazem o processo de seleção, o que se pergunta é ‘quem você conhece aqui dentro? Quem você acha bom?’”, afirma Letícia.

No entanto, as empresas que resistirem a esse movimento atrasarão, também, os próprios negócios. Principalmente se a ideia for crescer e ganhar relevância regional ou nacional. “Ter um conselho é uma necessidade que se impõe. Há empresas que atrasam esse processo e têm depois de correr atrás do prejuízo. Geralmente quando se percebe que a empresa está deixando de ser um jet ski e passando a ser um transatlântico. E você não consegue manejar o segundo com o mesmo pensamento de quem conduz o primeiro”, compara Wilson Carnevalli Filho, mestre em administração de empresas.

Fonte: Época Negócios - 07/06/2018