Uma das questões mais controversas das pesquisas Gallup é: “você tem um melhor amigo no trabalho?”. A empresa, que estuda engajamento de funcionários há 30 anos, destaca que muitos empregadores têm dúvidas sobre incluir ou não a pergunta em pesquisas internas.
Annamarie Mann, da consultoria, afirma ter ficado surpresa com esse fato. “Parece uma questão bem objetiva e sem muito espaço para debate”, escreve ela. Ainda que as pessoas passem grande parte do dia no trabalho, há empregadores que preferem que os funcionários deixem a vida pessoal do lado de fora. Normalmente são esses os gestores que têm as reações mais fortes sobre perguntar se os funcionários têm melhores amigos. E as reações, diz Mann, são variadas: alguns reclamam da linguagem, enquanto outros questionam a relevância da pergunta.
Mas então, por que a Gallup pergunta se os profissionais têm melhores amigos no trabalho? A resposta mais simples é desempenho. “Nossa pesquisa mostrou repetidamente uma ligação concreta entre ter um melhor amigo no trabalho e a quantidade de esforço que o funcionário coloca no emprego”, diz ela.
Mas Annamarie propõe um olhar mais amplo para o que está acontecendo no mercado de trabalho. “Vivemos em uma época em que a maioria dos funcionários espera mais do que o salário de seus empregos. O pagamento ainda importa, é claro, mas os profissionais buscam empresas que tenham culturas organizacionais excepcionais”, diz ela. “Há muitas coisas que se busca nessa cultura, mas normalmente algumas características são o sentimento de confiança, de pertencimento e de inclusão.”
E se passamos mais tempo no trabalho do que em casa, é natural querer construir relações com os colegas. “Queremos sentir que o trabalho vale a pena, e ter confidentes e apoiadores ajuda a desencadear esse sentimento. Queremos poder falar com os colegas para celebrar e lamentar coisas de nossa vida pessoal e profissional. Sem isso, o trabalho pode parecer solitário e isolador.”
Mulheres no trabalho
Annamarie Mann fala sobre a questão das mulheres que deixam o mercado de trabalho quando se tornam mães. “Não é que elas não qeiram trabalhar, mas as políticas corporativas muitas vezes fazem com que o trabalho se torne pouco prático para elas. Qual é o sentido de ficar mais de 40 horas por semana longe de sua família para ganhar um salário que vai ser gasto, em grande parte, com creche ou babá?”. As mães precisam pesar os prós e contras de trabalhar – mesmo aquelas que gostam muito de seus empregos, e ter boas relações com os colegas pode ser um importante ponto a favor do trabalho.
As empresas que já perceberam os benefícios de ter diversidade de gênero em seus quadros de funcionários estão buscando formas de atrair e reter mais mulheres, em diversos estágios da vida laboral. As estratégias vão de aumentar os salários a conceder promoções a cargos de chefia, mas deveriam incluir também criar uma cultura corporativa para que elas possam ter uma vida mais feliz no trabalho, e isso inclui ter amigos no escritório. Dois terços das mulheres nos Estados Unidos afirma que o aspecto social é uma das principais razões de ir trabalhar.
E o desempenho?
Para quem quer números para provar que faz sentido que as pessoas tenham amigos no trabalho, vamos aos dados. As pesquisas realizadas pela Gallup têm mostrado consistentemente que homens e mulheres que têm melhores amigos no trabalho têm desempenho superior. Em média, dois em cada dez profissionais dizem ter um melhor amigo no trabalho. Segundo Annamarie, se esse número aumentasse para 6 em cada 10, as empresas teriam 36% menos acidentes de trabalho, clientes 7% mais engajados e lucros 12% maiores.
“Quando os funcionários têm um senso de pertencimento como membros do time, são mais propensos a tomar ações positivas para beneficiar os negócios – ações que talvez eles nem considerassem se não tivessem uma relação forte com seus colegas”, diz.
Como o aspecto social do trabalho é tão importante para as mulheres, a Gallup realizou um estudo comparando as atitudes de mulheres que dizem ter um melhor amigo no escritório e as que não têm. As mulheres com fortes relações no trabalho têm menos chances de estar ativamente procurando um novo emprego, são mais ligadas aos colegas e confiam mais neles, têm mais chances de arriscar em tarefas que podem promover inovação e têm mais chances de reportar uma experiência positiva após um dia de trabalho, como gostar do que fazem e sentir que estão progredindo.
É importante lembrar, no entanto, que antes de incentivar as amizades no trabalho, os gestores precisam se assegurar de atender a outras necessidades de seus funcionários. Os profissionais precisam saber o que se espera deles, e buscam sentir que têm oportunidade de dar o seu melhor todos os dias, por exemplo.
Como incentivar as amizades?
A ideia não é que as empresas ou os gestores “fabriquem” as amizades, mas que criem uma cultura em que a amizade possa se desenvolver naturalmente. Confira dicas para isso:
- Promova a comunicação e colaboração
Essas são as bases de uma cultura inclusiva, e podem criar um caminho natural para que as pessoas criem relações. Os funcionários precisam acreditar que podem falar e compartilhar o que pensam. Incluir todos nessa conversa cria uma rede de segurança psicológica e cultiva a confiança e o sentimento de pertencimento. As empresas e líderes podem, por exemplo, criar fóruns para que os colaboradores compartilhem ideias para alcançar os objetivos estratégicos ou para melhorar a experiência dos clientes.
- Encoraje que as pessoas conheçam seus colegas
Muitos funcionários estão envolvidos em projetos que incluem mais pessoas do que os colegas que trabalham diretamente com eles. Esse tipo de estrutura pode criar oportunidades para que se criem relacionamentos na empresa. Os líderes também devem incentivar que os funcionários em áreas diferentes da empresa se conheçam – usando a intranet para conectá-los ou criando eventos durante o dia de trabalho.
- Promova e participe de atividades sociais
A cultura começa com os líderes. Eles dão um exemplo aos colaboradores através de suas ações – e tornam aceitável ou não que as pessoas se tornem amigas. Quase todas as empresas têm atividades sociais, como festas de fim de ano. Mas nem sempre os líderes participam desses eventos. Participar dessas atividades e promover o engajamento dos colaboradores deve ser uma prioridade para que os funcionários percebam que a socialização é a norma. Além dessas grandes celebrações, os líderes também devem ser vistos saindo para almoçar, conversando com pessoas no café e visitando os gerentes e seus funcionários.
Fonte: Época Negócios - 31/07/2018