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Matthias R. Reinold

No passado, uma das maiores preocupações dos cervejeiros eram os processos de limpeza e desinfecção das instalações e equipamentos da cervejaria. Havia muito dispêndio de tempo e recursos para a limpeza e desinfecção. Isso comprova o alto valor que se dá à higiene na produção de produtos microbiologicamente sensíveis, tais como cerveja, refrigerantes ou sucos.

Atualmente, a limpeza e desinfecção requerem muito menos tempo, devido ao extenso processo de automação e ao uso de procedimentos altamente especializados. Os produtos utilizados não são inovadores e sim a constante mudança e transformação das formulações destes produtos.

Além dos produtos químicos "clássicos", como o cloro, peróxido de hidrogênio, ácido peracético, compostos de quanternário de amônia, álcoois e muitos mais, os procedimentos ganham em importância, onde o agente de desinfecção é produzido apenas no local do usuário / consumidor.

A Tabela 1 apresenta uma visão geral dos produtos atualmente usados ​​ou ingredientes ativos e os processos e as vantagens e desvantagens associadas.

Tabela 1: As principais características dos produtos utilizados na desinfecção

Substância ativa / Processo

Espectro de ação

Faixa de pH

Compatibilidade de material

Compatibilidade de produto

Campo de aplicação 2)

Impacto ambiental

Duração

Observação 3)

Custos 3)

Cloro

++

7-12

- -

- -

Universal

- -

++

Permitido para água potável

++

Cloro por eletrólise

++

7-12

- -

- -

Depende da instalação (água potável / processo)

- -

++

Permitido para água potável

- -

Àcido peracético

++

2-7

- -

+

Principal-mente CIP

+

+

 

-

Peróxido de hidrogênio

+

2-7

-

++

Desinfecção de choque

++

-

Permitido para água potável

0

Ozônio

++

2-12

- -

++

Àgua potável, de banho, efluente

++

++

Permitido para água potável

- -

Radiação UV

+

2-12

++

++

Água potável / Processo

++

++

Permitido para água potável

- -

Dióxido de cloro

++

2-8

0

+

Universal

++

++

Permitido para água potável

++

Àcidos halogenados

+

1,9-2,5

+

++ (2)

CIP

0

0

Venenoso

-

Biguanidas

0 (1)

4-9

++

0 (2)

Desinfecção de choque

- -

- -

Difícil identificar

-

Isotiazolonas

+

4-7

+

-

Conservação / Estabilização

- -

- -

Sensibilização

-

Quaternários de amônia

+

4-10

+

-

Desinfecção manual de superfície

-

-

Elevada atividade de superfície

Difícil de ser enxaguado

-

Formalina

+

3-10

+

-

Desinfecção manual de superfície

Gaseificação

+

-

Classificado como cancerígeno

0

Álcoois

+

<7

0

0

Principal-mente higiene pessoal

+

+

Inflamáveis até levemente inflamáveis

-

Observações:

1) Lacuna na ação principalmente contra fungos

2) Veja observação

3) Escolha

Legenda:

++ = muito bom

+ = bom

0 = neutro

- = ruim

- - = muito ruim

Métodos de desinfecção clássicos


No caso dos produtos desinfetantes clássicos, são formuladas soluções aquosas contendo outras substâncias ao lado dos ingredientes ativos, tais como estabilizadores, solubilizantes e amplificadores de efeito ou componentes de estabilização de dureza.  

No processo da desinfecção automatizada dos tanques e tubulações (CIP), na lavagem de garrafas e no processo de enxágüe (rinsagem), e também no tratamento de água potável, dominam hoje os produtos de ação oxidativa. Estes incluem o cloro, ácido peracético e peróxido de hidrogênio.

O que todos os agentes desinfetantes oxidantes tem em comum é o fato de que eles possuem o mais amplo espectro de atividade, a ação mais rápida sem a formação de qualquer resistência possível.

Como o cloro é o único biocida oxidante estável em formulações altamente alcalinas, é de particular importância no campo da limpeza combinada. Ele atua como reforço em uma limpeza alcalina, é barato e como agente desinfetante possui um espectro de atividade abrangente. O cloro é importante, porque foi e é difundido em muitas áreas – desde o tratamento da água potável, a limpeza CIP, a limpeza por espuma etc, até a limpeza doméstica.

O cloro, também conhecido como cloro ativo, alvejante, hipoclorito, apresenta, no entanto, uma série de desvantagens. Sua atividade microbicida é fortemente dependente do pH. Em valores elevados de pH, o efeito é muito reduzido, de modo que para a limpeza alcalina são necessárias elevadas concentrações de cloro, para assegurar uma desinfecção adequada.

A carga para os diferentes materiais, especialmente elastômeros e aço inoxidável (pitting), pode levar a um desgaste muito elevado, respectivamente danos aos equipamentos. A elevada reatividade do cloro - especialmente na faixa de pH neutro a levemente ácido – pelas reações de cloração leva a subprodutos indesejáveis​​, tais como clorofenóis e outros hidrocarbonetos clorados (AOX = substâncias orgânicas halogenadas adsorvíveis por carvão), contaminar o efluente e mesmo provocar danos ao produto (por exemplo, cerveja).

Na produção de bebidas, principalmente por causa dos motivos anteriormente expostos, tenta-se na medida do possível, evitar o uso do cloro e de produtos que o contenham, especialmente em lugares onde o contato direto com o produto é teoricamente possível (CIP, estabilização da água fria na lavagem de garrafas, enxágüe, tratamento de água potável).

Há muito tempo utiliza-se o ácido peracético, a alternativa para o cloro para fins de desinfecção apenas. Ele encontra amplo uso hoje no campo da limpeza CIP, da limpeza de garrafas através de rinser até o engarrafamento asséptico a frio de bebidas não-alcoólicas.  

Além de umas poucas exceções (leveduras selvagens), o ácido peracético tem uma eficácia microbiológica similar ao cloro, é tecnicamente fácil de controlar (por condutividade), facilmente detectável ​​e também bem assimilado pelo meio ambiente.

As desvantagens econômicas com relação ao cloro, considerando as vantagens técnicas e ecológicas, vão para o segundo plano. A única desvantagem técnica é a elevada corrosividade com relação ao aço, aço inoxidável, metais não-ferrosos e elastômeros, o que, por exemplo, dificulta o uso em grandes superfícies de espumas baseadas em ácido peracético.

O peróxido de hidrogênio possui uma eficácia significativamente atenuada, quando comparado com o cloro e ácido peracético, principalmente no frio. Por isso o seu uso é muito limitado.

Maior significado possuem as variantes de pureza elevada, utilizadas para a desinfecção livre de resíduos de embalagens moles e embalagens de plástico (potes de iogurte). Aqui, livre de resíduos significa que após o tratamento efetuado, não é mais necessário o enxágüe com água potável.


O grupo de produtos não oxidantes, embora numericamente muito grande, apresenta volume de utilização muito menor na indústria de bebidas, quando comparado com os produtos de ação oxidante.

Eles são usados ​​principalmente na desinfecção manual (desinfecção de choque) e em partes na estabilização microbiológica de sistemas de água de resfriamento e água de consumo (resfriamento de água gelada, pasteurizador de túnel).

Procedimentos de desinfecção / Sistemas de desinfecção

Aos métodos de desinfecção somam-se todos aqueles desinfetantes gerados localmente através de dispositivos técnicos. Podemos distinguir quatro processos principais:

Radiação UV

A radiação UV é uma luz de curto comprimento de onda no espectro UV e é usada para matar diretamente as bactérias. A maior vantagem deste método é a ausência de resíduos, já que a energia das ondas eletromagnéticas é suficiente para matar os germes de modo sustentável.

Uma desvantagem desse método são os custos de aquisição e manutenção, e além disso, o reduzido alcance -  respectivamente - a ausência do efeito residual de desinfecção. Como não existe suporte material da ação de desinfecção, o efeito desinfetante é limitado à área que pode ser alcançada pela radiação UV diretamente. Os biofilmes que se formam nas tubulações não podem ser alcançados.

 

Ozônio

O ozônio é formado a partir de oxigênio atmosférico pela ação de radiação UV, respectivamente por uma forte descarga elétrica. É um biocida muito eficaz, que se decompõe novamente em oxigênio (amigável ao meio ambiente). Infelizmente a complexidade técnica de instalação e operação é muito elevada. Além disso, concentrações elevadas de ozônio no ar, sob o ponto de vista de saúde ocupacional, inspira preocupação e devem ser evitadas por controles rigorosos e elevado esforço técnico. Devido à sua rápida desintegração, também em forma de ozônio dissolvido, seu efeito residual é limitado.

Dióxido de cloro

 

Uma substância relacionada com o ozônio, no que diz respeito à estrutura química e funcionamento, é o dióxido de cloro (ClO2). Ele está, pela sua reatividade e atividade biocida, entre seus análogos estruturais, o ácido peracético e o ozônio.

Sua geração ocorre através de uma reação química obtida pela simples mistura de dois componentes – na maioria das vezes líquidos – em um vaso de reação, gerando uma solução concentrada de ClO2.

Pela diluição com água obtém-se a solução de uso correspondente. Esta, ao contrário do ozônio ou radiação UV, é  estável por longos períodos de tempo, proporcionando assim um efeito de depósito.

Devido às suas excelentes propriedades microbicidas, o seu bom desempenho ambiental, a sua inocuidade fisiológica, a tecnologia de produção relativamente simples e não menos importante, as suas vantagens econômicas, o dióxido de cloro é hoje utilizado na indústria de bebidas desde o tratamento da água potável e de processo, água de enxágue (rinser), enxágüe na enchedora de garrafas/latas, lavadora de garrafas, até a desinfecção CIP, passando pela desinfecção das esteiras transportadoras até a estabilização da água de resfriamento e água de processo.

Tanto a radiação UV, o ozônio e o dióxido de cloro devem ser gerados no local por razões técnicas, porque sua vida útil é tão curta que um transporte é impossível. Isto não se aplica à eletrólise de cloreto de sódio (sal de cozinha) em hipoclorito e hidróxido de sódio (procedimentos de desinfecção “à base de água”).

 

Desinfetantes à base de água

Os chamados “desinfetantes à base de água", são basicamente uma eletrólise de cloro e álcalis em um formato pequeno para produzir uma solução de cloro (“água sanitária”).  

Diferente da grande escala, a solução de cloro obtida por oxidação anódica não é estabilizada pela solução de hidróxido de sódio gerada pelo catodo, mas sim imediatamente diluída para a concentração de uso. Estas soluções de cloro não são nada menos que cloro em concentração relativamente baixa, comparado com um alvejante comercial.

O fato que os desinfetantes produzidos eletroliticamente até o momento não estarem sujeitos à Diretriz de Produtos Biocidas (na Alemanha), baseia-se unicamente em uma brecha legal que hoje é utilizada por diversos fornecedores de tais instalações.

Pelo fato de que esta Diretriz estar sendo submetida a uma revisão atualmente,  em um futuro previsível deverá ser fechada esta lacuna, o que possivelmente acarretará na expiração da licença de operação.

Outros biocidas produzidos in loco não são afetados, ou porque os próprios produtos ou seus compostos precursores são notificados como biocidas. O efeito da desinfecção da solução de cloro produzida eletroliticamente corresponde ao do hipoclorito de sódio disponível comercialmente, na mesma concentração e pH.

Também correspondem os riscos associados à compatibilidade de materiais (corrosão), a poluição (AOX) e danos ao produto possível (formação de clorofenóis). A única diferença significativa é o investimento na aquisição e manutenção, que é bem elevado devido à tecnologia complexa do sistema de uma eletrólise de cloro e álcalis.

 

Resumo

Deve notar-se que a questão higiene apresenta-se em um papel central na segurança da produção em empresas de bebidas, em tempos de operação de máquinas cada vez mais longos e aumento constante da produtividade. Nisso, os desinfetantes de ação oxidante, possuem um importante papel, tanto qualitativo quanto quantitativo.

Além de produtos clássicos como o cloro e o ácido peracético, que podem ser comprados como produto acabado, os processos de geração in loco ganham cada vez mais importância. Aqui deve ser enfatizado particularmente o dióxido de cloro, especialmente por causa de suas vantagens em termos de economia, eficiência e impacto ambiental.

Em algumas cervejarias ainda prevalece a visão errônea de se economizar na compra de produtos químicos para a limpeza e desinfecção. Troca-se um bom produto, bem formulado, por um “genérico”, que não traz resultados adequados e que ainda exige concentrações de uso de duas a três vezes maiores do que o produto formulado adequadamente. E mesmo assim, não é garantia de eficiência. O impacto do custo dos produtos químicos sobre o custo total de produção é reduzido e não justifica este tipo de economia.

A preocupação deveria ser com a otimização dos processos, equipamentos e instalações. Um exemplo disso é o eletropolimento da superfície de inox interna de tanques, que reduz enormemente a capacidade de as partículas aderirem e com isso, facilita a limpeza.         

 

Referências

  • Moderne Desinfektionsmittel – die Kunst der richtigen Auswahl.

Bernhard Unrecht e Ulrike Ohnemüller.

Brauwelt nº 9-10 (2010)

  • Processos de limpeza e desinfecção.

Matthias R. Reinold

O & G Alimentos - Novembro/Dezembro 2002 - nº 69 

 

Matthias R. Reinold

Mestre cervejeiro diplomado (Diplom-Braumeister – T.U. Berlin)

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