Quando Jack Welch assumiu a GE, em 1981, a companhia estava avaliada em US$ 13 bilhões. Ao deixar o posto de CEO, 20 anos depois, o valor da multinacional em Wall Street havia saltado para US$ 490 bilhões. Era a empresa mais valiosa do mundo. Fundada e liderada por Kenneth Lay, a Enron chocou o mundo ao quebrar, em 2001. A gigante do setor elétrico, com dívidas de US$ 13 bilhões, deu entrada no que até então era o maior pedido de falência da história americana. O que levou a trajetórias opostas duas das mais admiradas empresas dos Estados Unidos? A psicóloga social Carol Dweck, professora de Stanford pioneira nos estudos de desenvolvimento pessoal, tem uma resposta: estilos de gestão antagônicos, influenciados por duas mentalidades distintas – o mindset de crescimento e o mindset fixo. Batizados e definidos por Carol no livro Por Que Algumas Pessoas Fazem Sucesso e Outras Não, os mindsets (mentalidades) representam a maneira como encaramos a vida e reagimos ao fracasso.
Welch acreditava no desenvolvimento constante dos profissionais e no trabalho em equipe. Era capaz, segundo Carol, de ouvir, dar crédito e aprender com os seus erros. Todas as características que definem um líder com mindset de crescimento. Já a Enron, sob a direção de Lay, criou uma cultura corporativa de culto ao talento, típica de um mindset fixo. Falhar não era uma opção. Durante anos, os diretores da empresa maquiaram balanços e inflaram os lucros. Nesta entrevista, concedida após o lançamento no Brasil de Mindset: a Nova Psicologia do Sucesso, uma versão atualizada da obra que a alçou à fama, Carol explica como os dois tipos de mentalidade podem fazer os negócios e a sua vida muito diferentes.
A psicóloga social Carol Dweck, professora de Stanford
Como os diferentes tipos de mentalidade afetam as chances de sucesso na vida?
Dweck Algumas pessoas acreditam que nascem com uma quantidade fixa de talento, enquanto outras pensam que são capazes de desenvolver suas habilidades ao longo da vida. O primeiro grupo tem o que chamamos de mindset fixo. Já o segundo possui o mindset de crescimento. Ter um mindset de crescimento não significa achar que todos somos iguais ou que qualquer um pode fazer qualquer coisa, mas sim que todos podem melhorar consideravelmente trabalhando duro, aprendendo novas estratégias e recebendo mentoria. Nossas pesquisas mostram que os profissionais com mindset de crescimento tendem a ter mais sucesso por diversos motivos. Eles estão mais dispostos a aceitar novos desafios e não temem que um eventual fracasso os faça parecer pouco talentosos. Eles também são mais persistentes quando enfrentam obstáculos.
A senhora já disse que valorizar o intelecto e a inteligência nos fez falhar como sociedade. Pode explicar?
Reverenciar o talento é acreditar que ele é fixo. Ou você tem ou não. Isso favorece um modelo no qual as pessoas precisam se provar constantemente, em vez de se arriscar em projetos nos quais possam falhar. Ao passo que reverenciar o processo de tentar estratégias diferentes e aprender com os reveses encoraja as pessoas a encararem mais desafios e a serem mais persistentes.
Quais questões as pessoas podem se perguntar para saber qual tipo de mentalidade elas possuem?
Ninguém possui um mindset 100% fixo ou 100% de crescimento. Para descobrir qual deles predomina, você deve se perguntar se concorda que todos têm uma determinada quantidade de inteligência e podem fazer pouco para mudá-la. Se a resposta for sim, você tem um mindset mais fixo. Alguém com um mindset de crescimento diz: qualquer um, independentemente de quem seja, pode se tornar bem mais inteligente.
É possível virar a chave, ou seja, mudar a mentalidade?
Sim. Em nosso trabalho com jovens, ensinamos que toda vez que eles assumem uma tarefa difícil o cérebro pode formar novas e mais fortes conexões. Dessa forma, no longo prazo, eles podem aumentar suas habilidades. Explicamos as implicações disso e incluímos depoimentos de outros estudantes e de famosos admirados por eles contando como um mindset de crescimento os ajudou. Há também a mentoria entre os próprios jovens relacionada aos princípios do mindset de crescimento.
Ter um mindset fixo é um problema?
Todos nós adotamos um mindset fixo às vezes. Mas fazer isso boa parte do tempo pode ser um problema, porque, se você pensa que suas habilidades são fixas, você começa a se preocupar: eu tenho talento suficiente? Se eu fizer algo desafiador, isso vai revelar que eu não sou inteligente? Melhor, então, fazer alguma coisa que seja mais fácil para mim. Portanto, ter um mindset fixo pode te tirar dos desafios que irão te ajudar a avançar e te fazer evitar as adversidades, que também te fazem crescer.
Para a teoria do mindset de crescimento, então, o fracasso pode ser bom?
Fracassos e reveses podem ser bastante produtivos. Não é que ter um mindset de crescimento fará você necessariamente gostar de falhar, mas é muito menos provável que você veja isso como algo que te rotule como um fracassado ou incompetente. É mais provável você começar a pensar: ok, o que eu aprendi com isso? Elogiar apenas a inteligência de uma criança pode levá-la a um mindset fixo. Ela pode optar por desafios mais fáceis, só para não colocar o talento à prova
No mundo dos negócios, há muitos executivos bem-sucedidos que podem ser incluídos na turma dos que valorizam as habilidades fixas. Como você explica isso?
Eu não tenho dúvida de que alguém com mindset fixo possa ser muito bem-sucedido. Porém, nós vivemos hoje num mundo que muda a uma velocidade sem precedentes. E, mesmo que uma empresa descubra algo lucrativo, ela irá enfrentar concorrência rapidamente. Portanto, os profissionais realmente têm de ficar à frente da curva. É preciso estar aberto a más notícias e a críticas. A experimentar e olhar claramente para o que não deu certo e para o que você precisa mudar. Por isso, eu acredito que mais do que nunca um mindset de crescimento ajuda no mundo dos negócios.
O que fez esses profissionais de mindset fixo serem tão bem-sucedidos em grandes empresas?
Os negócios não estavam mudando tão rápido quanto agora. Pode ser que eles não tenham precisado das habilidades hoje necessárias para se manter atualizados. E, no passado, alguém que se apresentasse como gênio, agisse como gênio e classificasse os outros como gênios ou não, muitas vezes era reverenciado. Eles ganhavam status. Mas não acho que isso funcione tão bem atualmente. Hoje, você precisa receber retorno e encorajar o desenvolvimento de seus funcionários.
A senhora acha que atualmente as corporações estão mais abertas ao desenvolvimento gradativo das habilidades? Existe tempo – e paciência – para isso?
Espero que sim. Muitos negócios se tornaram bastante comprometidos em desenvolver seus times. E a ter seus funcionários comprometidos a desenvolver as próprias habilidades. Nós fizemos um estudo com as integrantes da lista de empresas Fortune 1000. Perguntamos aos funcionários dessas companhias qual era o mindset de sua empresa. Elas veneravam habilidades fixas ou acreditavam no desenvolvimento de todos? Descobrimos que os profissionais tendiam a concordar sobre o tipo de mindset de sua companhia. E, quando os funcionários diziam que as empresas tinham um mindset de crescimento, afirmavam também que elas valorizavam profundamente a criatividade e a inovação. Além disso, esses profissionais relataram que a empresa ficaria a seu lado, mesmo que eles não acertassem de primeira.
E nas descritas como de mindset fixo?
Os profissionais disseram que havia muitos segredos, competição e tomada de atalhos, para que certos indivíduos pudessem sair à frente. As empresas de mindset fixo sempre estiveram preocupadas em contratar talentos. Mas, alguns anos depois de contratá-los, os gestores muitas vezes não veem esse potencial todo em suas equipes. É o oposto das empresas de mindset de crescimento, mais preocupadas em lapidar seus jovens funcionários.
Quais são as consequências quando as empresas ficam obcecadas com talento, como foi o caso da Enron, segundo o seu livro?
Na Enron, toda a organização foi construída em torno da ideia de genialidade. E todos os esforços dos funcionários eram para mostrar como eles eram geniais. Isso pode levar, como descobrimos no estudo com as integrantes da lista de companhias Fortune 1000, à busca de atalhos para fechar um contrato, conquistar um cliente. E, além disso, a gestores que não conseguem admitir erros e receber feedback. A chefes que provavelmente não sabem ouvir, que podem roubar o crédito pelo trabalho dos outros e ainda colocar membros do grupo uns contra os outros. Nesse cenário, uma empresa não pode ir para a frente de uma forma eficaz, especialmente no mundo de hoje.
Quais conselhos a senhora pode dar a gestores que queiram criar essa mentalidade de crescimento?
É um processo longo e difícil, mas eles podem começar analisando o próprio mindset. E se perguntando se realmente acreditam que uma grande parte de sua equipe é capaz de crescer. Se eles acreditarem, podem colocar em prática maneiras de fomentar esse crescimento.
A senhora já disse que hoje os trabalhadores precisam de validação constante. A geração Y é mais propensa a esse comportamento?
Não sei o quão generalizado é, mas ouvi de profissionais de RH de diferentes organizações que muitos dos jovens que estão hoje nas empresas talvez tenham tido pais que seguraram suas mãos durante toda a jornada e que querem agora que o local de trabalho faça esse papel. Mas eu não quero fazer uma generalização sobre uma geração. Há aqueles que querem ser reconhecidos e afagados, porém também vejo muitos jovens empenhados em fazer a diferença e dar sua contribuição. E eles entendem que isso envolve enfrentar desafios.
Em seu livro, a senhora defende a tese de que certos elogios aos filhos podem não trazer bons resultados. Qual a melhor maneira de incentivá-los?
Nossas pesquisas mostraram que elogiar a inteligência de uma criança pode levá-la a um mindset fixo. Ou seja, a enfrentar desafios mais fáceis, nos quais poderá ser bem-sucedida, já que ela não quer colocar o status de sua inteligência à prova. Mas descobrimos que, quando você elogia o esforço ou a estratégia da criança, ela será orientada na direção de um mindset de crescimento, onde não é amedrontador ou arriscado aceitar um desafio. Onde não é debilitador experimentar um fracasso, pois ele faz parte do processo de aprendizado. Nesse caso, as crianças tendem a trabalhar mais duro, ao invés de se preocuparem em não ser inteligentes.
Fonte: Época Negócios - 18/07/2017