Para Jonathan Levav, brasileiros são inclinados a correr risco e começar um negócio. Falta só esse empreendedor mirar o mercado global. Levav é professor da Universidade de Stanford e ministra, em São Paulo, aulas do “Stanford Ignite”. O programa oferece aulas presenciais de negócios e está com inscrições abertas até maio para a turma deste ano. Levav fala sobre empreendedorismo — e como o país pode construir mais unicórnios.
Com base na sua experiência com brasileiros, algo nos diferencia de empreendedores em outras partes do mundo?
Eu tive experiências com empreendedores daqui e empreendedores do Chile. Sinto que os brasileiros são muito mais inclinados a correr riscos, mais abertos e mais propensos a querer começar um negócio. Então, sim, são bem diferentes. Mas empreendedores brasileiros, por outro lado, desenvolvem projetos para o mercado brasileiro. E tudo bem, porque o mercado é grande o suficiente — mas não oferece incentivo para criar algo global.
Deveríamos tentar ser mais globais?
Acho que vocês poderiam tentar construir um negócio pensando pelo menos no mercado da América Latina. Acredito que quanto maior o negócio que você cria, mais desenvolvimento econômico gera, mais empregos e mais inspiração para jovens brasileiros que queiram fazer o mesmo. Mostraria que o Brasil não exporta só commodities, o que é muito importante.
Na sua visão, esse pensamento menos global seria o que nos impede de ter mais unicórnios por aqui?
Na verdade, é uma série de favores. Em primeiro lugar, existe muito risco macroeconômico, que impede grandes investidores de fora de assinar grandes cheques aqui. Você tem de vez em quando, mas é raro. É muito difícil ver startups brasileiras recebendo US$ 400 milhões, e isso é por causa do risco macroeconômico. Em segundo lugar, está o sistema educacional. O número de engenheiros não é suficiente. Terceiro lugar: sim, você pode ser uma startup brasileira, crescer no Brasil e tudo correr muito bem — mas fica longe de outros mercados. Por fim, faltam mais fundos de investimento, o que é necessário. Você chega em um ponto em que fica sem saber como levantar muito dinheiro.
O que grandes empresas podem aprender com as dificuldades das pequenas?
Grandes companhias têm muitos recursos e processos — o que pode te paralisar um pouco. Você acaba perdendo a criatividade, que muitas vezes vem da falta de recursos. De maneira consciente ou não, ter muitos recursos acaba dando uma sensação de segurança. Por outro lado, a insegurança presente em startups força essas empresas a trabalharem duro e de forma criativa, atributos que costumam apontar para o sucesso.
Qual o objetivo do “Ignite”, de Stanford?
Tentamos mostrar que existe algo mágico sobre o Vale do Silício — com certeza há um DNA. O que tentamos fazer é pegar os elementos desse DNA e exportá-los. Se um número suficiente de empreendedores recebem esse DNA, aquilo vai incentivá-los e incentivar também empresas a alcançar o potencial que alcançariam se exatamente as mesmas pessoas e as mesmas empresas estivessem no Vale.
Do ponto de vista de um professor, como você enxerga o futuro da sala de aula?
Eu sou um tradicionalista. Já ensinei de forma remota e não foi a mesma coisa. As atividades não são as mesmas, a fluidez também não. Você recebe uma energia dos alunos em sala de aula — não há tanta energia quando você ensina de maneira remota. Aquele brilho que acontece no encontro de duas pessoas, que eu acredito ser tão importante para o aprendizado, não ocorre nessas formas alternativas. O problema é que a maioria das universidades não é escalável, então precisamos encontrar outros jeitos de entregar informação. Óbvio que a internet vai ajudar com isso. Mas eu não posso dizer honestamente que é a mesma coisa.
Fonte: Época Negócios - 21/02/2018