Pergunte a dois indianos por que o mundo corporativo, depois de engolir tantos livros, teses e pensadores, precisa falar de novo tipo de liderança. Se os indianos no caso, forem Raj Sisodia, fundador do Capitalismo Consciente, e Nilima Bath, coach, palestrante e professora de ioga, a resposta não será simples. Tampouco virá “sem energia”. A dupla buscou inspiração em uma tradição indiana, a Shakti [entidade que move o Universo, gera a vida e significa poder] para definir o que considera, em tempos de turbulências e grandes mudanças, uma liderança positiva e consciente.
Publicada no livro Liderança Shakti: o equilíbrio do poder feminino e masculino nos negócios, a tese deles é que a liderança predominante na economia e até na política, até o século XXI, baseia-se em aspectos do “poder masculino”. Ou seja, uma liderança pautada em valores positivos, como coragem e resiliência, mas também negativos, como a competitividade, controle e combate. “A forma antiga de liderar, que persiste há milhares de anos, gerou enorme progresso material, mas também muito sofrimento”, diz Raj Sisodia à Época NEGÓCIOS. O predomínio dessas características, diz Sisodia, ajuda a criar ambientes de pressão, com maiores níveis de estresse, ansiedade e depressão. O que estaria faltando nas empresas é a tal da “energia feminina” — manifestada por características como empatia, compaixão e criatividade.
Para Sisodia e Bath, um líder consciente (seja homem ou mulher) é aquele que busca e consegue praticar um equilíbrio entre os poderes femininos e masculinos. “Esse líder é capaz de caminhar entre qualidades díspares, como empatia e resiliência, de modo a tomar a melhor decisão para aquele momento”, diz Nilima Bath à reportagem. Ao equilibrar poderes e energias, o líder consciente, segundo eles, não agirá imprimindo seu poder sobre os outros, em nome de seus próprios interesses ou baseado no comando e controle. É um líder que criará um ambiente onde as pessoas terão “boa performance e não burnout”, segundo Raj.
A chave para desenvolver essa liderança mais equilibrada perpassa uma transformação interna, cultivando aquilo que Nilima define como “presença”. “É um estado de concentração onde você está calmo, centrado e equilibrado, a despeito das turbulências ao seu redor”, diz. Assim como a ioga, é preciso praticar a presença para evoluir. Isso inclui exercícios de mindfulness, por exemplo, e reflexões sobre a posição de poder do líder (“você exerce um poder baseado em privilégios”?), seu comportamento (“você é flexível na hora de agir?”) e a congruência de suas ações (“você toma decisões alinhadas ao seus valores e crenças?”).
Na visão deles, a liderança consciente, baseada no modelo Shakti, só é possível de ser praticada sob determinadas condições e que envolvem um propósito maior do negócio. “Se você é uma pessoa egoísta, que usa as outras para atingir seus objetivos, então você não é um líder. Você é um tirano e vemos muitos assim nas empresas, somente em busca de dinheiro e poder. Não sei se vão querer mudar.” Para Nilima, a vontade de mudar desponta em momentos de crise, onde a estratégia do líder para sua empresa precisa ser revista.
É natural pensar que a difusão dessa “energia feminina” nas empresas, contribuindo para a criação de mais líderes conscientes, depende da inclusão de mais mulheres na liderança. Mas não é só isso, defendem os indianos. “Precisamos de equidade, claro, mas precisamos trazer à tona as mulheres e tudo aquilo que elas representam: compaixão, leveza, suavidade, beleza, cuidados. O líder homem precisa absorver esses novos aspectos e mentalidade”. Do contrário, defende Sisodia, serão criados polos de poder, onde a competição pode aumentar, criando até uma espécie de “batalha de sexos”. “Precisamos de mais mulheres no poder, mas os homens que já estão lá precisam aprender com elas, cultivar novas formas de agir.”
Fonte: Época Negócios - 14/09/2018